"No fundo o que é um maluco? É qualquer coisa de diferente, um marginal, uma pessoa que não produz imediatamente. Há muitas formas de a sociedade lidar com estes marginais. Ou é engoli-los, tranformá-los em artistas, em profetas, em arautos de uma nova civilização, ou então vomitá-los em hospitais psiquiátricos"

António Lobo Antunes

22/11/2010

Rede de Cuidados Continuados subutilizada porque hospitais não enviam doentes - PUBLICO.PT

Coordenadora da Unidade de Missão da Rede revela que há unidades de convalescença com taxas de ocupação baixas.
 Quatro anos após a criação da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI), que hoje se assinala, há ainda "muitos hospitais, particularmente a norte, que não fazem a referenciação dos doentes para a Rede, após o internamento cirúrgico, o que faz com que a taxa de ocupação em unidades de convalescença ronde os 70 por cento". O desabafo é da coordenadora da Unidade de Missão para os Cuidados Continuados, Inês Guerreiro, que lança um apelo aos médicos para que passem a referenciar os doentes para as unidades de convalescença, após internamento.


"Os médicos não podem continuar a dizer que é burocrático dar informações sobre os doentes, essa é uma mentalidade que não se aceita. Isso é terceiro mundo", declara Inês Guerreiro, pedindo mudanças em nome da humanização dos doentes. "Temos de fazer uma grande mudança a nível dos profissionais de saúde, especialmente dos médicos, não apenas dos hospitais, mas também dos centros de saúde", defende. E frisa que "não se pode aceitar que um doente que saia de um hospital e vá para outro médico seja dos cuidados primários, seja da RNCCI, sem saber o que teve, que medicamentos lhe foram prescritos, que exames de diagnóstico fez e que tipo de cuidados necessita".


Em declarações ao PÚBLICO, a coordenadora de Missão revela que, de uma maneira geral, "os hospitais referenciam mal os doentes, mas é a norte que o problema se coloca", adiantando que a ARS-Norte (Administração Regional de Saúde) já foi alertada. Preocupada, adverte que, se não houver mudanças, "vai ser necessário proceder-se a uma reavaliação das unidades de convalescença, algumas das quais registam taxas de ocupação baixa". Cabeceiras de Basto e Felgueiras são alguns dos exemplos.


Filomena Cardoso, vogal do Conselho Directivo da ARS Norte, garante que a Região Norte é aquela que, "indiscutivelmente", tem mais unidades: 251 camas de convalescença, 430 de média duração e 602 de longa duração. "Apesar disso, Filomena Cardoso defende uma melhor agilização no funcionamento da Rede. "É preciso trabalhar com os hospitais para melhorar os processos dentro da própria Rede", disse, revelando que "há equipas afectas para trabalharem com as equipas de gestão de alta dos hospitais para se melhorarem os processos de referenciação".


A coordenadora de Missão faz uma "avaliação de sucesso" do trabalho feito ao longo dos quatro anos, mas não ignora a existência de falhas. Lamenta, por exemplo, que ainda não tenham sido lançadas as unidades de ambulatório (talvez em 2011) e diz que "neste momento é curta a resposta que existe também a nível da Segurança Social, porque faltam lares para acolher as pessoas que têm saúde e têm de sair das unidades de cuidados continuados, mas não têm para onde ir".


Olhando para a Europa e tendo em conta o envelhecimento da população de Portugal, Inês Guerreiro não tem dúvidas que dentro de dois a três anos vai ser necessário um "novo planeamento" com políticas mais eficazes para uma população cada vez mais necessitada de apoio social e de saúde. É isso a que se assiste em França, no Canadá, países que fizeram esta reforma há 30 anos. "A situação demográfica e epidemiológica do país vai continuar a envelhecer e as metas que definimos não serão suficientes. Esta é uma Rede que tendencialmente vai ter de ser ajustada", vaticina, defendendo uma atenção especial para os doentes mentais crónicos e para os que sofrem de demência.


Criada em 2006, a RNCCI tem como objectivo a prestação de cuidados continuados integrados a pessoas que se encontrem em situação de dependência.


Os números da Rede


65.000 - De 2006 até agora, já foram referenciados 65 mil casos, mais cinco mil do que os que foram tratados pela RNCCI.


101 - Segundo dados de Julho deste ano, existem 101 equipas domiciliárias. A Região Centro é a que apresenta mais: 42.
4500 - A coordenadora da Unidade de Missão revela que existem 4500 camas em funcionamento de várias tipologias: convalescença, média duração, longa duração e paliativos

Sem comentários:

Enviar um comentário